Por Cory Bunyard | Tradução: Alia Ponte

000 Meu interesse inicial sobre o Brasil começou com uma conversa em um táxi em Buenos Aires, quando o taxista me contou que “Aqui em Buenos Aires não temos dinheiro, ficamos tristes e fumamos cigarros. No Brasil, eles não têm dinheiro, tiram a roupa e dançam na praia”. O Brasil me pareceu mais meu tipo de lugar.

Dentro de um ano eu estava em um vôo de Los Angeles para o Rio. Meu plano inicial era viajar para o país por três semanas, fazer um curso para certificação para ensinar ioga em Garopaba (no Estado de Santa Catarina), mas isso foi deixado de lado por falta de fundos, e o medo de mais gastos além do que eu esperava. Eu não estava desencorajado até então, meses antes de viajar, encontrei alguém pela internet.

Ele tinha o nome de Angel, mas manterei isso em segredo. Minha intenção era encontrar alguém para me mostrar o Rio, porém eu encontrei mais que isso. Depois de meses de conversas pela internet e pelo telefone, decidimos que ele iria me encontrar no aeroporto, já que eu estava para chegar à noite e ele me levaria para seu apartamento onde eu poderia decidir como seria o dia seguinte, se eu ficaria no apartamento ou iria para um albergue, dependendo de como o encontro pessoal se desenvolvesse.

Eu nunca deixei o apartamento dele. Era amor. Minha primeira experiência no Brasil não foi nada do que a maioria dos turistas, pois eu vivi a vida de um residente em Niterói, em um pequeno apartamento de dois quartos perto da favela. Eu tinha pouco dinheiro para gastar em excursões e passei meus dias acompanhando-o no trabalho, andando ou fazendo exercícios em Icaraí, pegando o ônibus da favela à Itacoatiara, vendo museus em dias livres, passeando pelo shopping quando o calor era insuportável, almoçando com ele e seus colegas de trabalho em restaurantes locais, fazendo compras no Supermercado Sendas e Hortifruti. Tudo de ônibus e a pé. Eu vi outros poucos americanos quando fomos à Ipanema. Achei as praias do Rio cheias e caóticas em comparação com nossos pequenos paraísos em Niterói.

Eu retornei aos Estados Unidos conforme planejado, mas com a intenção de voltar o mais rápido possível com a esperança de começar o processo de vivermos juntos no Brasil. Tínhamos pensado e pesado nossas opções como um casal homossexual e nossas realidades financeiras e de trabalho, resolvemos que seria mais viável minha mudança para o Brasil do que a mudança dele para os Estados Unidos. Era o que eu queria de qualquer maneira. Eu retornei ao Brasil apenas três meses depois com planos de ficar, pelo menos três meses. Nós iríamos nos adaptar. Precisávamos ficar juntos e ver onde aquilo iria dar. Eu fazia massagem aqui e ali por dinheiro com um amigo, e ajudava no escritório de design de vez em quando.

Eu havia pagado algumas contas antecipadamente. No começo, eu raramente vagaria sozinho por medo pela segurança ou habilidades com o idioma. Aprendi um pouco de português antes da minha primeira viagem, e aprendi um pouco de espanhol antes de descobrir que era menos desafiador do que alguns diziam, mas estava longe de ser fluente. Ele falava um pouco de inglês e nós nos entendíamos. Penso que era bom no começo, já que não podíamos ter pequenas discussões pela falta de vocabulário e as discussões sempre terminariam em “está bem, eu te amo”. Eu tinha que voltar aos Estados Unidos novamente. Soubemos da possibilidade de uma União Estável.

Foi utilizado com sucesso por alguns casais homossexuais para a imigração do parceiro estrangeiro, mas é requerida uma prova de relacionamento estável por dois anos ou mais na qual, ambas as partes provassem não apenas a duração do relacionamento, mas também a dependência financeira entre si, como o casamento civil nos Estados Unidos. Não tínhamos condições de provar qualquer dos itens ou continuar com ele me sustentando e, eu não estava pronto para deixar meus débitos com o cartão de crédito, que era igual a um montante maior que nosso aluguel em pagamentos mensais.

Eu continuei a ir e vir por mais quatro anos no total, a cada vez com um progresso financeiro. Dinheiro não era nosso único desafio. Ajustes culturais se tornaram muito mais que uma realidade, uma vez que começamos a viver juntos por até seis meses, até extrapolar os limites do meu visto de turista, fazendo trabalhos de tradução por fora e vivendo frugalmente. O único evento especial em todos estes anos foi uma viagem romântica para Búzios pelo nosso segundo aniversário, e ainda fomos de ônibus. Deixei tudo que eu conhecia para trás. Eu não tinha amigos ou emprego, tinha pouco conhecimento do idioma e pouco dinheiro. Era fora da realidade, mas acreditávamos naquilo. Às vezes eu perdia a esperança e começava a odiar a situação.

A pobreza, a dificuldade de fazer coisas que nos Estados Unidos eram tão simples, a falta de trabalho, a vez em que fomos assaltados e o fato de ele ser a única pessoa que eu podia dividir tudo desgastaram nosso relacionamento. Isso tudo, aliado ao desafio de ser um casal homossexual sem um simples contrato marital para resolver nossa situação, eventualmente desgastava a nós dois, especialmente ele.

Esperando no Kansas na casa de minha mãe para finalmente me mudar de vez e ele voltar de um projeto em Angola com dólares para termos uma casa e finalmente começar o processo de união estável, recebi um e-mail dele, pela primeira vez todo em português, explicando que ele não conseguiria continuar. A última vez que eu fui embora foi demais para ele emocionalmente falando, e ele não sabia se suportaria mais aquilo. O relacionamento havia se tornado um fardo e ele não acreditava mais como antes. Ele até estava se consultando com um terapeuta. Foi como uma pedra em meu coração, mas no fundo eu o entendia e acredito que previa aquela situação. Eu não estava seguro se estava mais desapontado com o fim do relacionamento ou com o fato de não me mudar para o Brasil.

As pessoas aceitam as barreiras que construímos entre nossas nações porque elas não sabem o quão ridículas estas barreiras são quando você só quer estar com alguém que você ama. Recentemente, a Suprema Corte do Brasil legalizou a união estável para casais do mesmo sexo, um grande triunfo. Eu pensei que enquanto os Estados Unidos estavam caçando terroristas, o Brasil estava ganhando a batalha pelo amor. Recentemente meu ex-companheiro e eu temos nos falado mais e eu estou planejando uma visita ainda este ano.

 *esse artigo foi escrito em uma edição da Soul Brasil impressa no ano de 2008.

Facebook Comments