Por Maria Helena Tinto Boidart
Os primeiros relatos sobre as orquídeas no ocidente aparece nas pesquisas de Theophrastus (372-287 a. C.), que foi o primeiro a usar a designação “Orkhis”, uma palavra grega que significa “testículos”, pela semelhança das raízes de algumas espécies com essas glândulas. Também, em vários relatos médicos, elas aparecem como medicamento indicado ao tratamento de distúrbios sexuais.
Nessa concepção, os gregos as viam como o símbolo da virilidade e da fertilidade. As orquídeas fascinam as pessoas desde a antiguidade, tanto que já foram o símbolo do amor, do luxo e da beleza durante séculos. Conforme muitos escritores, Confucius (551-479 a. C.), citava as orquídeas em seus trabalhos e desde esta época os chineses as chamavam “A planta da Fragrância do Rei”. Consideradas afrodisíacas, eram usadas como um dos principais ingredientes para filtros amorosos.
A primeira classificação coerente das plantas, foi estabelecida pelo sueco Carl Von Liné em 1735, usando a denominação “Orchidaceae” para toda a família das orquídeas. A pedido do Rei da Bavária, Maximilian Joseph, que havia visitado o Brasil, von Martius, botânico e von Spix, naturalista, ambos alemães, fizeram uma expedição por 4 anos (1817-1820) pela Amazônia, coletando e desenhando a flora brasileira.
A expedição cobriu quase 1400 milhas, investigando as áreas da Amazônia até a fronteira do Peru. Juntos, os cientistas escreveram um relatório da expedição, “Reise in Brasilien” (Viagem no Brasil). Esse trabalho iniciado por eles, foi publicado em 1906 na “Flora Brasiliensis” e deu origem à primeira grande obra dedicada exclusivamente às orquídeas brasileiras. A realização dessa obra contou com a participação de diversos cientistas, sendo concluída pelo belga Alfred Cogniaux e trazendo desenhos e aquarelas cedidas pelo brasileiro Barbosa Rodrigues, botânico e diretor do Jardim Botânico do Rio de Janeiro.
A descoberta de um número ainda maior de espécies de orquídeas certamente veio com o descobrimento das Américas, mas a grande divulgação de seu cultivo aconteceu na Inglaterra, quando em 1818 floresceu uma Cattleya labiata nas mãos do botânico William Cattley, cujos bulbos foram descobertos por ele entre as folhagens usadas para embalar um carregamento de plantas vindas do Brasil. Ele as colocou em vasos e algum tempo depois, floresceu uma das Cattleyas. Esse foi um momento marcante na história das orquídeas. Assim, nesse século se deu uma verdadeira mania pela orquídea tropical, que alcançou preços altíssimos. Com isso, tanto a busca por orquídeas tropicais aumentou, como muitos habitats foram explorados e certas espécies colhidas ficavam cada vez mais raras.
Alguns cultivadores passaram a obter informações sobre o habitat das orquídeas através dos coletores de plantas e começaram a desenvolver técnicas de cultivo mais adequadas às espécies. Baseando-se nas informações de ventilação, rega e umidade, o botânico e taxonomista John Lindley da Royal Horticultural Society de Londres estimulou o jardineiro Joseph Paxton a utilizar estufas com ambientes diferentes para simular cada habitat, sendo ele o primeiro a realizar isso. Esse fato ocorreu em 1830, quando Lindley fez a classificação das orquídeas. Durante o restante do século, a Inglaterra permaneceu como o principal país importador de orquídeas.
Nessa época, cientistas, botânicos, jardineiros e coletores passaram a atribuir às orquídeas o seu nome, como por exemplo, John Lindley (Gênero: Lindleyella, Espécie: Cattleyopsis lindleyana); William Cattley (Cattleya labiata); Sander (Vanda sanderiana); etc.
Em 1854, registrou-se a primeira orquídea híbrida na Royal Horticultural Society de Londres, sendo até o presente, registradas mais de 110.000 híbridas. No fim do século, Noël Bernard, um biólogo francês, percebeu a presença de filamentos microscópicos envolvendo as raízes das orquídeas. Tratava-se de um fungo, identificado mais tarde como Rhizoctonia. O resultado de suas pesquisas, contendo uma descrição da associação entre as orquídeas e o fungo (cultura simbiótica) foi publicado após 10 anos de estudo, em 1909, abrindo novos rumos para a cultura de orquídeas.
Em 1922, o cientista americano Lewis Knudson verificou que ao utilizar uma gelatina estéril contendo sais minerais, açúcares e pH adequado, poderia reproduzir em laboratório os mesmos efeitos do tal fungo, possibilitando a germinação das orquídeas. Através deste processo (cultura assimbiótica), é possível nos dias atuais realizar o cultivo de plantas desde a semente e a produção dos híbridos.
A carência de combustível durante a Primeira Guerra Mundial, dificultou a manutenção das estufas e assim, foram perdidas muitas coleções. As Américas, inclusive os Estados Unidos, não sofreram esta carência e o interesse pelas orquídeas foi despertado, o que estimulou a criação de diversos viveiros e o aumento, em grande escala, do cultivo de híbridos.
Na evolução dos estudos sobre as orquídeas, em 1960, o botânico francês George Morel descobriu a cultura meristêmica, um método que necessita de equipamentos e só pode ser realizado em laboratório. Através do meristema obtêm-se centenas de espécies idênticas sem germinar a semente, isto é, somente a partir do tecido da planta mãe, as células, em condições adequadas, se multiplicam de forma rápida e intensa e as plantas geradas são clones da planta mãe.
Pela forma natural de reprodução das orquídeas, as flores polinizadas geram cápsulas de sementes e, dependendo da planta, estima-se que cada cápsula poderá conter até 800.000 sementes. Essas minúsculas sementes possuem apenas as funções germinativas, não contendo nutrientes que alimentam as novas plantas em seus primeiros estágios de vida, como acontece com outras sementes que até servem, inclusive, de alimento aos animais. Assim, estas dependem da sorte de caírem em um local nutritivo e com condições adequadas à germinação.
Características das orquídeas
Algumas características fazem com que uma planta seja incluída na família das orquidáceas, como por exemplo, a flor possuir os órgãos de reprodução feminino e masculino fundidos em um só corpo chamado coluna ou gynostemium. Também, a forma irregular de seus segmentos florais. A flor da orquídea constitui-se de 3 sépalas e três pétalas, sendo que uma das pétalas é modificada e chama-se labelo, que em geral, é a parte mais intensamente colorida da flor, variando muito na sua forma e perfume. Quanto a sua forma, pode parecer com uma abelha fêmea (gênero Ophyrs) ou com uma vespa fêmea (gênero Drakea ou Cryptostylis) ou então assemelhar-se a um balde (gênero Coryanthes). E quanto ao perfume, pode ser adocicado ou desagradável, forte ou suave, tendo como única finalidade atrair o polinizador e garantir a reprodução da espécie.
Em geral, as orquídeas são terrestres (freqüentes em zonas temperadas, embora existam muitas delas nas zonas tropicais) ou epífitas (regiões tropicais). As epífitas possuem raízes aéreas e vivem sobre as árvores ou sobre rochas e, ao contrário do que diz a crença popular, elas não são parasitas, apenas usam o “hospedeiro” para melhor se fixarem, obtendo seus nutrientes e a água da chuva através de suas raízes.
Quanto a altitudes, elas são freqüentemente encontradas na faixa de 500 e 2000m acima do nível do mar, embora também possam ser encontradas do nível do mar até 4000m de altitude.
Curiosamente, algumas orquídeas como a Eurystyles estão entre as menores plantas que produzem flores e outras são tão grandes que atingem até 4m de altura, como a Selenipedium ou a Grammatophyllum papuanum que podem pesar toneladas. Há também relatos sobre orquídeas subterrâneas, duas espécies australianas, a Rhizanthella slateri e a Rhizanthella gardneri, sendo que esta última além de crescer, floresce sob o solo.
Usos
Desde os primórdios e até o presente, muitas civilizações se utilizam de várias substâncias extraídas das orquídeas para diferentes fins, como medicamentos, cosméticos, adesivos, mas talvez o uso mais curioso, deva-se aos povos Maias e aos Astecas que usavam a Vanilla planifolia, para extrair a baunilha, que na sua forma pura é conhecida como vanilina, comercializada como aromatizante. Embora a Vanilla planifolia é considerada como nativa do México, atualmente ela é intensamente cultivada ao longo dos trópicos, inclusive em Madagáscar que é um dos seus maiores produtores.
O cultivo de orquídeas como passatempo
Ganhando ou comprando-se um vaso de orquídeas, pode-se começar a cultivá-las. Um processo simples de reprodução de orquídeas, pode ser feito pelo corte, isto é, por um processo em que as novas plantas são originadas a partir da divisão das raízes de uma planta adulta e o replante de suas partes em novos vasos.
Quanto às instalações, as plantas provenientes de outras regiões podem apresentar dificuldades de adaptação ao novo ambiente, exigindo do cultivador a reprodução do seu ambiente natural. Já, em relação às nativas, adaptadas ao local do cultivo, basta dependurá-las em uma árvore, onde pode ser muito bom para o desenvolvimento da planta.
De uma maneira geral, apesar das orquídeas apreciarem umidade ambiental elevada, a maior parte delas não gosta de ser mantida dentro de um substrato sempre molhado.
Em muitas cidades pode-se encontrar clubes de orquidófilos, os quais podem fornecer a orientação necessária ao principiante, bem como calendários de eventos para os que desejarem participar de concursos. O que, sem dúvida, é um passatempo muito prazeroso e encantador.
* Maria Helena Tinto Boidart é biomédica e mestre em química. A brasileira tem diversos trabalhos publicados em revistas científicas internacionais e possui experiência em ensino e pesquisa na Universidade São Paulo (USP).
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