Por Lara Lanna
Nos últimos meses, tem ganhado força no cenário econômico internacional uma discussão relevante: a possível desvalorização do dólar americano como parte de uma estratégia deliberada do governo dos Estados Unidos, especialmente sob a administração do ex-presidente Donald Trump.
Esse movimento, que vem sendo analisado por economistas e autoridades financeiras, tem implicações significativas não apenas para os EUA, mas para a economia global e, em particular, para o Brasil, que convive com uma dinâmica cambial sensível e recente aumento na tributação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).
A recente decisão da agência de classificação de risco Moody’s de rebaixar a nota de crédito soberano dos Estados Unidos sinalizou um alerta importante para os mercados internacionais. Em termos práticos, o rebaixamento reflete uma avaliação de que o governo americano, diante do elevado endividamento e desafios fiscais, perdeu parte da sua confiabilidade financeira.
O cenário gera uma expectativa natural de enfraquecimento do dólar no mercado cambial. Embora possa parecer um efeito negativo para o país, esse possível enfraquecimento pode estar alinhado com os objetivos explícitos do governo Trump, que visa justamente tornar a moeda americana menos valorizada para incentivar a indústria nacional e melhorar a balança comercial.
Governo Trump usa a Desvalorização como Ferramenta de Competitividade?
Desde o início do seu mandato, Donald Trump indicou, ainda que indiretamente, sua preferência por um dólar menos forte. O objetivo central dessa política é tornar os produtos “Made in USA” mais competitivos globalmente, estimulando o crescimento das exportações e reduzindo as importações.
Especialistas indicam que essa desvalorização busca fortalecer a indústria americana, tradicionalmente ofuscada pelo setor de serviços, ao tornar os produtos nacionais mais acessíveis para mercados estrangeiros. Um dólar enfraquecido reduz o custo em moeda local para compradores internacionais, aumentando a demanda pelos produtos americanos e, consequentemente, impulsionando a indústria e o emprego domésticos.
Podemos dizer que uma desvalorização pontual pode ser vantajosa para os Estados Unidos e para outras economias, pois torna o país mais atrativo para investimentos externos e facilita o comércio. Dados evidenciam que desde 2017, a moeda americana caiu mais de 6% frente ao real, mais de 7% frente ao euro e cerca de 8% no índice DXY, que mede seu desempenho em relação a uma cesta de moedas internacionais.
Riscos: Enfraquecimento Prolongado e Perda de Credibilidade
Entretanto, especialistas alertam para os riscos de uma desvalorização prolongada e derivada da perda de credibilidade da moeda americana. O dólar é a principal moeda global de reserva e referência para precificação internacional de bens e serviços. A estabilidade dessa moeda é fundamental para o funcionamento do sistema financeiro global.
Na ausência de uma moeda substituta de escala global, a perda de prestígio do dólar poderia desestabilizar o sistema financeiro internacional, elevando a volatilidade, provocando fuga de capitais e aumentando o custo de financiamento dos Estados Unidos.
Em análise recente na revista The Economist, Kenneth Rogoff, nomista e professor de Harvard, avalia que moedas como o yuan chinês e o euro podem ganhar espaço na economia formal, enquanto criptomoedas tenderiam a crescer em mercados paralelos. No entanto, destaca-se que essas transições são graduais e que o papel do dólar, por sua longevidade e abrangência, dificilmente será substituído a curto prazo.
Também é alertado que uma queda expressiva da moeda americana poderia gerar inflação interna nos EUA, já que produtos importados ficariam mais caros, impactando diretamente o poder de compra dos americanos e elevando custos para empresas dependentes de insumos estrangeiros.
O problema fiscal americano é um dos principais fatores que ameaçam a estabilidade do dólar. Sem um ajuste claro nas contas públicas, com gastos superiores à arrecadação e aumento da dívida pública, a confiança dos investidores pode ser abalada.
O “Acordo de Mar-a-Lago” e a Diplomacia Econômica
No início do governo Trump, circulou no mercado a notícia de um suposto “Acordo de Mar-a-Lago”, um conjunto de intenções formulado no resort de mesmo nome, onde o presidente recebeu líderes políticos e empresariais.
O acordo propõe uma troca entre segurança militar e acesso ao mercado interno americano, em contrapartida a um dólar mais fraco e um fortalecimento da indústria dos EUA. Para alcançar isso, o governo Trump utiliza tarifas e barreiras comerciais para encarecer produtos importados, estimulando a indústria nacional e pressionando outros países a aceitar o dólar desvalorizado como parte do arranjo.
Além disso, o acordo contemplaria a conversão da dívida de curto prazo do Tesouro americano em títulos de longo prazo, com prazos de 50 ou 100 anos, sem pagamento periódico de juros, uma estratégia para aliviar pressões fiscais e melhorar os déficits internos e externos.
Reflexos da Desvalorização do Dólar no Brasil
Paralelamente a esses movimentos globais, o Brasil implementa medidas fiscais que afetam diretamente o consumo e o investimento da população e das empresas, especialmente no que tange ao Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).
Desde 23 de maio, entrou em vigor um decreto que unifica a alíquota do IOF em 3,5% para todas as operações de câmbio, incluindo compras de moeda estrangeira em espécie, transações com cartões internacionais, cartões pré-pagos e cheques de viagem. Antes, a alíquota variava de 1,1% para compra em espécie a 3,38% para outras operações.
O aumento eleva significativamente o custo para o consumidor brasileiro, que agora paga mais caro para adquirir dólares para viagens ou remessas internacionais. Por exemplo, ao comprar US$ 1.000 em espécie, o brasileiro desembolsa hoje cerca de R$ 135 a mais do que antes, considerando a cotação atual do dólar. Para operações não especificadas, a tributação terá incidência de 0,38% na entrada e 3,5% na saída, ampliando o impacto do imposto.
Além disso, a tomada de crédito por pessoas jurídicas, incluindo microempreendedores, terá um custo maior devido à elevação do teto de IOF, o que pode refletir em despesas empresariais mais altas e impacto no custo de operação das companhias. No setor de previdência complementar, aportes mensais acima de R$ 50 mil passarão a ser tributados em 5%, encarecendo investimentos em planos VGBL para valores mais elevados.
A política de possível desvalorização do dólar promovida pelo governo Trump, amparada por estratégias comerciais e fiscais internas, coloca o mundo em um momento decisivo para o sistema financeiro global. O momento é de cuidadosa análise por parte de investidores e gestores econômicos. Afinal, o sistema financeiro global passa por um momento de possível redefinição de suas bases tradicionais.
Em sintonia com essa visão de controle financeiro, a Soul Brasil se dedica constantemente em manter seus seguidores informados sobre a cotação do dólar e análises do cenário mundial. Na nossa página “De Olho no Dólar” , confira insights importantes para embasar suas decisões financeiras de forma mais informada.