boy 1807518 1280A água é, ao lado do petróleo, o mais estratégico dos recursos naturais da atualidade. Há algumas décadas, geólogos e cientistas já afirmavam que esse bem natural seria motivo de futuras guerras e mortes em variados locais do mundo e, ao que tudo indica, em breve isso realmente pode acontecer.

Com o crescimento do impacto das atividades humanas sobre a natureza, a disponibilidade de água se encontra cada vez mais escassa, sem falar em algumas áreas que já apresentam uma tendência natural para esse problema.

De acordo com os estudos mais recentes na área da Geopolítica, 1/4 da população mundial enfrenta agora uma grave escassez de água por pelo menos um mês por ano e a crise está levando muitos a buscar uma vida mais segura no exterior.

A escassez de água hoje já afeta aproximadamente 40% da população mundial e, segundo estimativas das Nações Unidas e do Banco Mundial, secas poderiam colocar 700 milhões de pessoas em risco de deslocamento em 2030.

O século 20 foi de intenso desenvolvimento e industrialização no mundo inteiro e o uso da água, em todos os continentes, cresceu mais do que o dobro da taxa de crescimento populacional. Essa dissonância está levando atualmente muitas cidades a racionar água, de Roma e Cidade do Cabo a Lima e municípios do Brasil.

Sahel 5A crise da água tem estado todos os anos, desde 2012, entre os cinco maiores perigos na lista de Riscos Globais por Impacto do Foro Econômico Mundial. O problema é tão sério que, em 2017, secas severas contribuíram para a pior crise humanitária desde a Segunda Guerra Mundial, com 20 milhões de pessoas na África e Oriente Médio se vendo obrigadas a abandonar suas casas devido à escassez de alimentos e aos conflitos envolvendo acesso a água.

De acordo com um registro de conflitos por água chamado de Water Conflict Chronology, 925 conflitos hídricos, grandes e pequenos, desde a época do rei babilônico Hammurabi à atualidade, aconteceram e acontecem no mundo devido à água.

O levantamento mostra, no entanto, que a maior parte dos conflitos está relacionada à agricultura. Talvez isso não seja surpreendente já que a agricultura representa 70% do uso da água doce no planeta.

Na região de Sahel, na África, por exemplo, há registros frequentes de violentos enfrentamentos entre pastores e agricultores devido à escassez de água para seus animais e cultivos. À medida que aumenta a demanda por água, também cresce a escala dos potenciais conflitos.

Em nenhum lugar o efeito duplo de estresse hídrico e mudança climática é mais evidente do que na ampla bacia dos rios Tigre e Eufrates, que inclui Turquia, Síria, Iraque e oeste do Irã. Segundo imagens de satélite, a região está perdendo água subterrânea mais rápido que quase qualquer outro lugar do mundo.

Como prever e evitar conflitos por água

hoover dam 3780254 1920Apesar de uma temática complexa e que envolve poder e disputas seríssimas, há pesquisadores que vão além de constatar o problemas, mas buscam compreender como prever e evitar futuros conflitos.

Essa capacidade de enxergar vínculos entre eventos aparentemente díspares ajudou orientar o trabalho de Charles Island com a associação Água, Paz e Segurança (Water, Peace and Security), uma iniciativa financiada pelo governo holandês e um grupo de seis ONGs americanas e europeias, incluindo o Pacific Institute e o World Resources Institute.

Eles desenvolveram uma Ferramenta Global de Alerta Precoce, que usa inteligência artificial para prever conflitos. O sistema combina dados sobre chuva, safras ruins, densidade populacional, riqueza, produção agrícola, níveis de corrupção, secas e inundações, entre muitas outras fontes de dados, para produzir alertas de conflito.

Os potenciais conflitos são mostrados em uma projeção de Mercator com pontos vermelhos e laranja até o nível do distrito administrativo. Atualmente este sistema alerta para cerca de 2.000 possíveis pontos de conflito, com uma taxa de acerto de 86%.

Embora a ferramenta de previsão identifique conflitos em potencial, ela também pode ajudar a entender o que está acontecendo em áreas que já estão enfrentando disputas devido à escassez de água.

Uma solução para o problema pode começar internamente

Apesar dos esforços positivos e promissores, o vínculo entre escassez de água e conflitos não é tão simples como parece.

Infelizmente, não existe uma solução única que possa ser aplicada a várias situações. Em muitos países, a simples redução de vazamentos no encanamento pode fazer uma grande diferença: o Iraque perde até dois terços da água tratada devido à infraestrutura danificada.

waterfall 2531194 1920O World Resource Institute também sugere abordar a corrupção e reduzir a extração desmedida para agricultura. Charles Iceland propõe até mesmo aumentar o preço da água para refletir o verdadeiro custo de fornecê-la. Em muitas partes do mundo, as pessoas se acostumaram a ver a água como um recurso abundante e barato, e não algo que deveria ser valorizado como um tesouro.

O nível de água disponível também pode ser aumentado por técnicas como a dessalinização da água do mar. Atualmente, a Arábia Saudita atende 50% de suas necessidades de água por meio desse processo.

A reciclagem de águas residuais também pode oferecer uma alternativa de baixo custo e fácil de implementar que pode ajudar as comunidades agrícolas afetadas pelas secas.

Vários países estão impulsionando iniciativas para administrar melhor a água. O Peru, por exemplo, requer que os provedores de serviços de água revertam parte de seus lucros em pesquisa e uso de infraestrutura verde na gestão de águas pluviais.

O Vietnã está combatendo a poluição industrial ao longo de sua parte do Delta do Mekong e também está integrando infraestrutura para garantir uma distribuição mais justa entre seus residentes urbanos e rurais.

À medida que as mudanças climáticas e o crescimento populacional continuam a agravar o problema das secas em todo o mundo, essas soluções serão cada vez mais necessárias para interromper o conflito e a migração.

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