Por Laís Oliveira
Diferentemente do que aconteceu com o estilo axé music, que estourou no Brasil nos anos 1990 e sofreu com a falta de renovação de artistas nos anos seguintes, a música sertaneja tem mantido frequência na aparição de novos músicos. A cada ano, cantores e duplas, até então desconhecidas, ganham espaço no mercado. E isso justifica a mais recente pesquisa sobre as preferências musicais dos brasileiros: o sertanejo é o número um do ranking.
Uma pesquisa realizada em 2018 pela consultoria JLeiva Cultura & Esporte, com participação do Datafolha, ouviu milhares de pessoas e traçou um panorama dos hábitos culturais dos brasileiros. A pesquisa pediu aos entrevistados para citar os três gêneros musicais que mais gostavam, por ordem de preferência. O resultado mostrou que o sertanejo é o estilo de maior popularidade, citado por 37% dos entrevistados, por jovens a partir dos 16 anos. Seguido pelo funk que foi citado por 28% deles. Essa tendência já é predominante há alguns anos, na verdade.
Outra pesquisa, dessa vez do Ibope, também procurou saber qual o estilo mais ouvido pelo país e, de acordo com os resultados, 58% dos brasileiros escutam sertanejo pelo menos uma vez por semana. Ainda de acordo com a pesquisa, o público majoritário que aprecia o sertanejo são pessoas da classe B e C, com idade entre 25 e 34 anos.
O sertanejo brasileiro é um estilo musical que nasceu das raízes do país e se tornou preferência nacional. O ritmo hoje é ouvido em qualquer lugar e em todas as classes sociais e surgiu da cultura caipira para se misturar à música eletrônica, ao funk, ao arrocha ou qualquer outro ritmo que justifique investimentos – e ganhos milionários. Sim, o sertanejo rende milhões a diversas duplas e cantores solos pelo Brasil.
Entre os anos 90 esse estilo musical dividiu espaço com o axé vindo da Bahia com duplas de enorme sucesso como Zezé di Carmargo e Luciano, Leandro e Leonardo, Chitãozinho e Xororó, entre outras. Já com a chegada dos anos 2000, um novo momento da música sertaneja entra no Brasil: o sertanejo universitário. Começam a proliferar duplas como João Bosco & Vinícius, Jorge & Mateus, Guilherme & Santiago, Maria Cecília & Rodolfo e César Menotti & Fabiano. As canções passaram a tratar de temáticas mais jovens, como baladas e conversas pelo celular, e a sonoridade ganhou novas influências, tal como o axé e o funk.
Desde então, o sertanejo cresceu ainda mais e, hoje é o ritmo mais escutado no Brasil. A partir de 2010, o empoderamento feminino também ganhou espaço e vozes como Marília Mendonça (a mais nova do meio e a de mais sucessos emplacados), Maiara & Maraísa e Simone & Simaria são cada vez mais ouvidas neste universo. Por isso o estilo musical tem tantos fãs e domina o cenário brasileiro há anos – ele agrada os mais diversos públicos, de variadas faixas etárias, classes sociais, gêneros, personalidades e grupos: há músicas para todos.
De 2015 até o final de 2018, variadas duplas e cantores solo ganharam milhões de reais com shows pelo Brasil e, com tamanho sucesso, levaram turnês para outros lugares do mundo reunindo fãs e novos ouvintes até no Japão. Em 2018, o Spotity liberou o ranking dos artistas mais escutados no Brasil e a dupla sertaneja Zé Neto e Cristiano foi o grande destaque do ano. Seguidos por outra dupla do mesmo ritmo e tão famosa quanto, os goianos Jorge e Matheus.
Os direitos autorais, de vendagens e frequência de shows não param de bater recordes. Todas as semanas, aparece uma nova dupla sertaneja de diversos cantos do país. Mas, afinal, por que o gênero reina absoluto nas rádios, internet, stream e televisão do Brasil? O sertanejo contemporâneo é resultado de uma mistura que tem origem em séculos passados, quando se iniciaram as representações da cultura caipira no país, mas marcada profundamente pela pasteurização e pelas referências diversas incorporadas nas últimas décadas, que formataram o gênero que reina absoluto nas paradas brasileiras.
Produtores e empresários do ramo musical afirmam que o aumento da relevância desse tipo de música em todo o país se deu devido ao crescimento do agronegócio no Brasil, isto porque “a música sertaneja se difundiu com as feiras do agronegócio”, afirmou Paulo Cesarino, dono de um estúdio de música há 20 anos no mercado brasileiro e onde já gravaram artistas como Gustavo Lima, Michel Teló e outros.
O fato de o sertanejo ter, no início dos anos 2000, se incorporado a outros gêneros se transformando, assim, no sertanejo universitário, foi uma mudança fundamental para sedimentar seu sucesso. Quando os artistas começaram a trazer outras influências para as músicas como o eletrônico e o pop, isto fez o gênero despontar definitivamente em festas e bares.
Aliando-se estes fatores a bons produtores musicais que descobrem talentos, especialmente no Centro-Oeste do Brasil, em lugares como Goiás, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso, forma-se a receita que explica a predominância e sucesso do sertanejo em todas as regiões brasileiras.
A maioria dos cantores e duplas surgem em Goiânia, Goiás. Com estúdios e produtoras, a cidade também oferece um ambiente favorável ao gênero. Desde 1995, a capital de Goiás hospeda alguns dos maiores festivais de música do Brasil, sendo Goiânia Noise o primeiro deles. Isso inspirou eventos voltados ao público sertanejo em outras regiões do país.
Com tanto sucesso e aprovação do público não é de se admirar que tantas apostas musicais surjam no mercado sertanejo mês a mês. Alguns emplacam hits instantaneamente, outros continuam tentando. O fato é que muito provavelmente este estilo musical vai predominar no Brasil por vários anos ainda.
Texto absolutamente incrível! Parabéns pelo trabalho. Quando li que o sertanejo passou por um processo de “pasteurização”, esse texto me ganhou de vez. O uso desse termo explica de forma sucinta o que é o sertanejo atualmente e como ele se expandiu para o topo. Brilhante.