Por Lindenberg Junior e Laís Oliveira
Radicado na Califórnia desde 2014, o cineasta, designer e fotógrafo Raphael Bittencourt, natural de Curitiba, conversou com a Soul Brasil no início de Julho e a apenas dois dias de fecharmos uma edição temática sobre Cinema e Teatro. Não deu tempo de incluirmos esse artigo interessante sobre o cinema brasileiro e a carência de uma “Indústria Cinematográfica”, o quase monopólio na distribuição e a ineficácia do governo brasileiro no que se refere a um sistema efetivo de incentivo à sétima arte.
Raphael possui uma estética sensível que nasceu de uma constante busca por diferentes pontos de vista e interpretações no campo visual. A trajetória de sua carreira o levou naturalmente ao cinema, como uma forma de rever sua arte e aprimorar a maneira de contar histórias (visuais). Após realizar diversos cursos e estudos em cinema e produzir seus próprios filmes, seu trabalho se tornou reconhecido no Brasil e internacionalmente, com indicações e premiações em festivais pelo mundo.
Paralelamente aos seus trabalhos criativos, Raphael foi professor de direção de fotografia para cinema por vários anos no Centro Europeu, em Curitiba. Com o sonho de se mudar para Los Angeles para fazer um mestrado em cinema e ganhar experiência vivendo na “meca” da indústria cinematográfica, ele decidiu que em 2014 tinha chegado a sua hora. Com um Brasil enfrentado uma crise econômica e política e escândalos de corrupção (a operação Lava-Jato), a imensa necessidade de Raphael se aprimorar e evoluir como profissional gritaram e, em 2016, ele concluiu seu mestrado em Cinema pelo New York Film Academy em L.A.
Obviamente, a escolha por Los Angeles não foi coincidência, pois, como Nova York é referência de Broadway, em L.A a referência é Hollywood. “O Brasil hoje carece de algo que possa ser chamado de uma ‘indústria Cinematográfica’. Existem alguns poucos heróis tentando produzir de maneira independente, existem algumas corporações vinculadas ao meio televisivo que monopolizam a distribuição e interferem diretamente na produção (de maneira nem sempre positiva) e existe uma espécie de máfia dos editais. Em outras palavras, fazer cinema sério e de qualidade no Brasil continua muito difícil”, relevou o cineasta.
Segundo Raphael, o cinema brasileiro ainda é muito pouco conhecido e procurado internacionalmente. Em Los Angeles, entre os jovens na faixa entre 20-35 anos, de diferentes nacionalidades, o primeiro e frequentemente único título brasileiro que vêm a cabeça deles é, incrivelmente, Cidade de Deus, de 2002.
Ele questiona esse hiato de mais de uma década, para o público de fora do Brasil, após o sucesso de Cidade de Deus, do diretor Fernando de Meirelles. “Estamos em 2017, o que aconteceu nos últimos 15 anos? Cadê os filmes Brasileiros que entraram na memória permanente do cinema, e do público, internacional nesse período. E quanto ao que foi produzido antes de 2002? O mundo lembra do que produzimos?”.
Caminhando contra a “maré ruim” brasileira, ele segue fazendo suas produções. Entre os trabalhos de Raphael Bittencourt no cinema, destacam-se Insubordinação (2008), Melhor roteiro no Festcine – Festival de Cinema de Pinhais, Seleção Oficial no Gramado Cinevideo, Troféu Hors Concours na Mostra de Cinema Centro Europeu; DRY (2015), Seleção oficial nos festivais: Treasure Coast International Film Festival, Festcine – Festival de Cinema de Pinhais, Festival de Cinema da Lapa, Los Angeles Cine Fest; The Dress (2016), Seleção oficial: LABRFF – Los Angeles Brasilian Film Festival e o mais recente BID (2016) que concorreu no Festigious International Film Festival – Los Angeles 2017 e foi um dos premiados.
Para o cineasta, Hollywood está ávida por novos conteúdos e produções internacionais ou multinacionais, então os produtores brasileiros precisam se organizar para mostrar seus trabalhos e serem reconhecidos. Se você é estudante, produtor iniciante ou mesmo tem alguma experiência, mas busca se aprimorar, Raphael dá algumas dicas valiosas para conquistar o sonho de ser reconhecido:
“Em primeiro lugar e mais importante: não dependa do Estado! Evite cair naquele pensamento comodista de que se não conseguir emplacar o projeto em um edital, não tem filme. Nada disso, corra atrás de se qualificar em marketing e negócios”. Assim como mencionado em um artigo do cineasta Lucas paz (em inglês) para nossa edição especial “Cinema and Theater”, Raphael também menciona que é essencial fazer networking e conhecer fornecedores, palestrantes, professores, enfim, o círculo de profissionais da indústria.
Outro pronto que ele frisa ser importante, por mais óbvio que pareça, é: assistir a filmes, séries, documentários, clipes musicais, mas com um olhar crítico e analítico, identificando tendências. “E seja ético acima de tudo. Ao encontrar alguém que respeite e confie em seu trabalho, cultive isso. Mantenha essas pessoas por perto e retribua, sempre”, aconselha Raphael. E por fim, ele incentiva os iniciantes e amantes da sétima arte “persista, insista. Cinema não se faz de um dia para o outro. Não é fácil, mas não é impossível”.
Nossa!!!! Que matéria!!! Vivo na pele essa dificuldade de fazer cinema no Brasil! Monopólio total!
Raphael, se tiver algum filme já finalizado, não deixe de inscreve-lo no nosso “Festival Brasil de Cinema Internacional”. Nosso festival acontece no Rio de Janeiro. Mesmo não recebendo nenhum auxílio governamental, temos sempre recebido filmes, de longa e curta metragem de vários países. Temos tido, até agora, a sorte de contar com jurados de alto nível e um público interessado. A inscrição é feita pela internet, através de 3 empresas especializadas e já está aberta.
Roni de Lima – A maneira que temos de produzir é sermos competentes, não apenas tecnicamente ou artisticamente, mas também estrategicamente, vendo o cinema também como business, sempre. Conforme estamos de acordo, é difícil, mas tem jeito. Insistir e persistir. Dentro de meu grupo de parceiros e desenvolvedores, há tempos já, constatamos uma realidade triste, mas é fato: é mais encontrar reconhecimento internacional do que dentro do próprio país. As vezes o caminho mais sensato e curto para chegar ao público e a distribuição no Brasil passa por fora dele. Sendo assim, o pulo do gato (um deles) é conseguir conferir um lado “universal” as nossas histórias brasileiras para que isso aumente o interesse e a aceitação internacional. Isso, obviamente, precisa ser pensado já na fase de concepção do projeto. Não fazemos filmes para morrerem na prateleira, certo?
Guil Silveira – Obrigado por passar por aqui, ler a matéria e comentar.
Veja a sincronia, já estou com dois filmes (100% independentes e isentos de verbas estatais) inscritos na edição deste ano do Festival Brasil de Cinema Internacional. São eles o “Absent” (http://www.imdb.com/title/tt4831386) e o “BID – A Licitação”(http://www.imdb.com/title/tt6156016), este último o meu mais recente, cujo poster está representado na matéria, e é um “proof of case” de um longa metragem.
O Absent, por enquanto, só foi exibido no Brasil no Festival da Lapa, no Paraná.
O BID, por enquanto é inédito no Brasil, mas já acumula algumas premiações e indicações internacionais (Best Editing e Honorable mention – Director no Festigious Film Festival, indicação de “Melhor Poster” no Los Angeles CineFest, seleção oficial no Roma Cinemadoc). Quem sabe a premiere Brasileira não será por aí?