Por Kátia Moraes

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O negócio começou meio frenético. Para seguir o roteiro, Noah teve que falar tudo rápido e levei um certo tempo para sacar as piadas. Meu cérebro demora para esquentar os motores. Eu não trabalho como intérprete e tenho o maior respeito pela rapaziada que consegue entender e traduzir tudo na bucha. Lembro quando ainda estava no Brasil e assistia o Oscar e agora entendo perfeitamente como é difícil traduzir piadas e comentários que precisam de uma explicação prévia para fazer sentido.

Choveu o dia inteiro no centro de Los Angeles onde fica o Estádio (ou Arena) Crypto pontocom que até 2021 se chamava Staples Center. Aliás, um dos fundadores do estádio é um brasileiro chamado Rafael Melo que trabalhou como gerente financeiro da Embraer. Por conta do aguaceiro, alguns foram chegando atrasados como a Meryl Streep e a Taylor Swift. Eu gosto dessa coisa de falar entre as mesas e mexer com os artistas ali sentados. Improvisação faz tudo muito mais vivo.

E vivo, vivo e bem-disposto estava o senhor Noah e a quantidade de mulheres que foram nomeadas esse ano. Minha favorita da nova geração é a Billie Eilish. Adoro a discrepância estética dela comparada com o resto. Fico aqui imaginando se um dia alguma mulher vai subir no palco topless sem dar a desculpa que pisou na cauda do vestido. Tipo Gal Costa dando um toque poético à música de Cazuza.

A grande rainha da composição apareceu depois da introdução carinhosa da Brandi Carlile: Joni Mitchell. Adoro quando mostram respeito as que abriram caminho. Infelizmente a câmera não mostrou muito isso no rosto e no corpo de algumas outras. Os fãs da Celine Dion, por exemplo, viram o que eu vi também: Taylor Swift pegando o troféu das mãos da Celine como quem não olha o garçom no olho quando vai a um restaurante.

Tenho que confessar que fiquei surpresa com a apresentação da Sza. Aquela coreografia fingindo cortar o pescoço de alguns homens foi um pouquinho demais para mim. Como disse uma amiga minha, “eu não me sentiria muito à vontade sentada naquelas mesas ali na frente quando começaram aquela dança com as espadas.” Acho que censurariam se tivesse sido um homem fazendo isso. Mas amei o empoderamento da música Flowers da Miley Cyrus: “Eu posso comprar flores para mim, Escrever meu nome na areia, Falar comigo mesmo por horas, Dizer coisas que você não entende, Eu posso me levar para dançar, E eu posso segurar minha própria mão, Sim, eu posso me amar melhor do que você.”

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Estádio (ou Arena) Crypto ponto.com

Quem dera eles mostrassem todos os vencedores de todas as 85 categorias durante a transmissão pela TV. Não mostraram nem a Michele Obama que ganhou na categoria Melhor Audio Book. Quem sabe um dia eles chegam lá? Duvido. Muita grana envolvida na produção desse show que precisa ser compacto para caber num certo espaço de tempo no canal de TV CBS e atrair o maior número de telespectadores. E eles conseguiram.

Desde 2020 o show não era tão assistido. 30% de aumento. Já que eu queria ver mais do que a TV me ofereceu, chequei no Youtube e fiquei feliz de saber que o argentino Cheche Alara foi o diretor musical do show preliminar novamente. E adorei quando a cantora Patty Austin comentou “quero ver menos competição e mais colaboração.”

Como brasileira, queria ter visto Ivan Lins (que aqui nos EUA chamam de Aivan Lins), Eliane Elias e Luciana Souza que concorreram na categoria Melhor álbum de jazz latino. Queria ter visto a cantora americana Gretchen Parlato que adora e já gravou muita música brasileira (e que entrevistei no Brazilian Heart Live no meu Instagram) e que concorria na categoria Melhor Álbum de jazz vocal.

Mas fiquei feliz que o nome da Rita Lee e da Astrud Gilberto apareceram na tela. Meu coração também sorriu quando Stevie Wonder falou sobre o Tony Bennet, quando Tina Turner foi homenageada, quando a Tracy Chapman magicamente apareceu com Luke Combs, mas senti falta de alguém ter tocado uma composição do Wayne Shorter para alegrar o coração da minha amiga Carolina Shorter que foi companheira do Wayne por tantos anos. E para arrematar o evento, Annie Lennox pediu o cessar-fogo no final da homenagem que fez a Sineád O’Connor e Harvey Mason Jr., representando a Academia, comentou sobre as pessoas que morreram durante o festival de música em Israel.

O show é mais que música, dança, amor, desavenças, ti ti ti e política. O discurso da Tammy Hurt, diretora do Board of Trustees do Grammy disse tudo: “o show é para lembrar que quando as palavras e a política fracassam, nossas melodias, ritmos e harmonias entram em campo e criam uma ressonância emocional que transcende barreiras e tocam lá no fundo da alma coletiva. (…) Vamos harmonizar o nosso futuro juntos.”

* Katia Moraes é cantora, compositora e artista carioca. Ela é colaboradora de longa data da revista Soul Brasil e vive em Los Angeles desde 1990. Para saber mais sobre ela, visite: www.katiamoraes.com

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